Sinopse: Antes da Batalha de Hogwarts, ela fez uma promessa de que cuidaria do irmão gêmeo de seu namorado. Será que ambos terão forças para superar a perda do melhor amigo?
Hogwarts – 02 de maio de 1998 – Momentos antes da batalha.
null viu os cabelos flamejantes dos seus dois melhores amigos e aproximou-se incerta já que não queria atrapalhar um momento íntimo dos dois. Por sorte, Fred a viu e seu sorriso denunciou que ela poderia ir até eles.
A garota não conseguiu conter um sorriso, nunca conseguia quando estava perto deles, era como se as áureas daqueles dois transmitissem uma alegria que contagiava seu peito.
- Como estão as coisas lá dentro? – A voz de George ressonou, quando ela estava próxima o bastante, era nítido em sua voz que ele estava nervoso. Todos naquele ambiente estavam.
null havia sido designada pela Profª McGonagall, a ajudar os demais professores com os alunos mais novos que haviam ficado. Fred e George foram designados para cuidar das entradas não oficiais do castelo, entradas estas que conheciam melhor do que ninguém.
- Agitadas. Tive que sair um pouco, e no caminho pensei: Que tal uma cerveja amanteigada quando tudo acabar? – Perguntou a garota, unindo as mãos atrás das costas e mordendo o lábio inferior. Os gêmeos deram uma risada nasalar sincronizada.
- Só se você pagar, baixinha. – George disse, aproximando-se dela e a abraçou. A garota com certeza foi pega de surpresa, mas retribuiu o abraço com entusiasmo.
- Por favor, se cuida, Forge. – Ela disse, usando o apelido que havia inventado e ele a apertou com mais força quando o ouviu. – Não queremos você sem as duas orelhas, vai ficar mais feio do que nunca!
- Há há há! – George respondeu irônico, soltando-a do abraço e apertando o nariz da garota com os dedos dobrados. – Mesmo sem a orelha continuo sendo o gêmeo mais bonito.
- Você bem que queria. – Fred defendeu-se rindo, descruzou os braços sob o peito e empurrou o irmão, para que ele entendesse que agora era o momento dele com a sua namorada.
- Tá bom, se cuida, null. Vou cobrar aquela cerveja amanteigada depois. – Piscou para a amiga e se afastou para dar privacidade ao casal.
- Hey. – Fred disse com um meio sorriso, pousou suas mãos na cintura da garota, que deslizou suas mãos até seus ombros.
- Como você está? – Perguntou ela, olhando nos olhos do homem que fazia as borboletas do seu estômago revirarem. Fred amava os olhos de null, eram sua parte preferida do corpo dela, ele podia mergulhar naquele oceano castanho durante horas e quando via as ramificações de suas írises, aquela cor lhe lembrava do chocolate quente que sua mãe fazia, doce, aconchegante e delicioso, os olhos dela eram um lar.
- Estou bem nervoso, na verdade. Não vou mentir. Estou nervoso de saber que minha família inteira está aqui, que você está aqui, e que não estaremos todos juntos para nos proteger. – Fred nunca havia sido tão honesto, e não havia motivos para mentir para ela.
- Ei, vai ficar tudo bem. Você vai ver, logo estaremos todos juntos n’A Toca, comendo tortinhas de abóbora comemorando a morte de Você-Sabe-Quem.
Fred sorriu incerto com a fala da garota.
- Ou você está sabendo de algo que eu não sei? – Emendou ela, unindo as sobrancelhas enquanto Fred deslizava suas mãos da cintura dela para as costas, puxando-a para um abraço que logo foi retribuído.
- Gred? – A voz da garota chegou baixa em seu ouvido, ele afundou o nariz em seu pescoço, sentindo o aroma doce de baunilha que sempre exalava dela, aroma este que ele sempre sentia quando estava produzindo poções do amor para a sua loja de artigos e logros. – Aconteceu alguma coisa?
- Não, eu só estou com um pressentimento ruim... – Suspirou. – Profª Trelawney passou por mim agora pouco e me deu um abraço esquisito. Muito longo e muito esquisito. Desde então não consigo tirar da cabeça que talvez ela tenha visto algo. Algo de verdade, para variar. – Ele admitiu afastando o rosto para olhá-la nos olhos mais uma vez.
A garota riu, uma risada gostosa que o fez sorrir junto.
- Passou pela sua cabeça que ela pode ter te abraçado apenas porque é meio doida? Ou porque fazia tempo que não te via?
- É, você está certa. Estou ficando maluco. – Suspirou ele, ligeiramente aliviado. – Ah, quero te dar algo.
null soltou-se do abraço para olhar para ele com curiosidade, as sobrancelhas arqueadas em tom de dúvida. Ela conhecia o namorado o suficiente para saber que, às vezes, os presentes dele explodiam, gritavam ou soltavam fumaças estranhas. Ao invés disso, Fred levou a mão até o pescoço e retirou uma corrente de prata muito fina, com um pingente na frente e outro atrás, como um escapulário. Os pingentes eram redondos, e em um deles tinha a letra F e no outro a letra G.
- Mãe nos deu isso faz alguns anos. Não gosto muito, mas uso por baixo da roupa quase sempre. – Disse o ruivo, passando a corrente por cima da cabeça da garota, deixando a letra F virada para frente. O ato fez com que ela segurasse o queixo dele com uma mão e colassem suas bocas.
O garoto não perdeu tempo em puxar o corpo dela mais para perto, as mãos na altura das costelas dela, enquanto a garota corria os dedos para os seus cabelos. O beijo não durou muito, o momento não era propício e Fred ainda tinha mais uma coisa para falar com ela.
- Eu preciso te pedir uma coisa. – A voz dele saiu rouca e ligeiramente ofegante, quase inaudível.
- Claro.
- Caso algo aconteça hoje, me promete que vai cuidar do George?
- Gred, não fala isso. – A garota uniu as sobrancelhas novamente, algo recorrente quando se tratava de Fred Weasley.
- Eu estou falando sério, ele não vai aguentar sozinho, ele é o mais mole de nós dois. Me promete? Promete que vai cuidar dele? – Perguntou ele, pondo as mãos nos ombros dela, e abaixando um pouco para que seus olhos ficassem da mesma altura.
- Tá, tá, eu prometo, seu chato. – A garota deu a língua para ele, que sorriu aliviado. – Vou te dar um presente também. Não quero que se sinta sozinho. – Ela retirou um anel dourado do seu dedão, o anel era aberto, de modo que era regulável, e tinha o desenho de uma lua e um sol em cada ponta. O ruivo riu com o ato, e entregou seu dedo mindinho para que ela colocasse o anel.
- Obrigado, te devolvo quando estivermos tomando as cervejas amanteigadas que você prometeu. – Ele disse, esticando a mão para ver o anel de longe e ela riu. Ela sempre ria, era outra coisa que ele amava nela.
- Tá bem. Vou voltar lá para dentro, ou a McGonagall vai vir me buscar pela orelha pessoalmente. – Brincou a garota, abraçando-o mais uma vez. Fred tinha um cheiro amadeirado que ela adorava, mas junto sempre vinha bem ao fundo, um cheiro de fumaça de tantas explosões e fogos de artifício que ele e o irmão sempre soltavam. Era o cheiro que ela mais gostava.
Selaram os lábios mais uma vez.
- Eu te amo, null. – Ele sussurrou ao ouvido dela, fazendo todos os pelos do corpo dela se arrepiarem.
- Também te amo, Gred. – Ela disse sorrindo. – Até mais.
Condado de Cornwall – 09 de maio de 1998 – Residência dos null.
Ponto de vista: null
Uma semana da minha última conversa com Fred.
O sentimento em meu peito dizia que poderia ter acontecido ontem, ou há dois anos, é impossível conseguir quantificar exatamente o que era real e o que não era. Ainda parecia mentira, eu ainda sentia o seu cheiro em minhas roupas e ainda ouvia sua risada em minha cabeça com tanta clareza que era realmente impossível dizer que já havia passado uma semana.
Perdi a noção do tempo encarando a foto ao lado da minha cama que tiramos em Hogwarts três anos antes: Lee carregava Angelina nas costas fingindo que a deixaria cair, Fred e George me seguravam no colo, cada um agarrado em uma perna minha, eu dava uma risada genuína levando a cabeça para trás enquanto fazia chifrinho na cabeça dos dois. Aquele momento brotou em minha cabeça, apenas cinco estudantes se divertindo antes de sair para um passeio em Hogsmeade, ir ao povoado com os gêmeos e Lee era tão difícil quanto uma prova de Transfiguração, absolutamente tudo virava uma arma em suas mãos, qualquer piar de um passarinho era motivo para eles darem sustos em nós e qualquer olhar torto era motivo para mais piadas e brincadeiras. Angelina e eu sempre voltávamos com a barriga doendo de tanto rir.
Agora eu estava ali, há uma semana deitada em minha cama. O rosto inchado e o corpo dolorido, exausto e sem forças para fazer qualquer coisa.
Minha avó não entendia a gravidade da situação, afinal eu não quis preocupá-la com a realidade: Como eu iria dizer à uma senhora de oitenta anos que meu namorado havia morrido na maior batalha entre bruxos já vista na humanidade? Como eu diria a ela que ele faleceu defendendo uma causa nobre que era questão de vida ou morte? Como eu diria que também estava lá?
Apenas a poupei de detalhes mais sórdidos e disse que nós terminamos o namoro.
Vez ou outra ela entrava em meu quarto, me trazia sopa, acariciava meu cabelo e me trazia cartas que alguma coruja deixava na entrada do correio em sua porta da frente.
As cartas estavam empilhadas ao lado da nossa foto que mexia-se calorosamente, minha risada ecoando pela eternidade.
- Querida, você precisa sair desta cama em algum momento... – Ela disse certa vez, acariciando meu pé que estava para fora da coberta. – A vida tem que seguir.
E se eu não quisesse?
- Você vai ficar bem, meu amor, têm pessoas que estão preocupadas com você. – Ela disse, abanando mais uma carta e colocou sob a pilha de cartas que já estavam na cômoda.
- Talvez você pudesse pelo menos responder seus colegas? – Insistiu.
A morte já era uma velha conhecida minha, quando eu havia recém feito dois anos, meus pais foram assassinados por dois homens de capa preta que nunca foram identificados pela polícia, porém um andarilho, a única testemunha ocular presente no momento, deu seu testemunho dizendo que os dois homens estavam com gravetos nas mãos e um raio verde saiu de um deles depois de algumas palavras irreconhecíveis serem ditas. Na época o homem foi dado como louco, porém minha avó nunca esqueceu desta história, e depois que recebemos minha carta para Hogwarts recebemos também uma visita do próprio Dumbledore que explicou tudo à minha avó, conseguimos finalmente entender o que realmente havia acontecido e qual o motivo de meus pais terem sido assassinados. Estavam no lugar errado e na hora errada, Comensais da Morte acharam que seria divertido tirar a vida de dois nascidos trouxas e eu acabei sendo criada por minha avó paterna.
Depois que minha avó saiu do quarto, sentei-me na cama sentindo minha cabeça pesar uma tonelada, e comecei a ver as cartas que havia recebido.
“Querida null,
Faz tempo que não recebo notícias suas, estou preocupado com você.
Se quiser me fazer uma visita para conversar um pouco, estou na casa de minha avó como sempre.
Não me arrisco a ir até você pois você sabe que reprovei na prova prática de aparatar.
Estou com saudades,
Neville Longbottom”
“null,
Não tive notícias suas e muito menos de George, estou realmente preocupado.
Se você não me responder até sábado, irei aparecer aí.
Lee Jordan”
“null,
Por favor, me responde. É a terceira carta que eu te mando.
George também não me responde e não sei mais o que fazer!
Lee está muito preocupado também.
Com carinho,
Angelina Johnson"
“Prezada Srta. null,
Gostaria muito de conversar com você pessoalmente sobre uma possível oferta de emprego na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts.
Sei que os momentos são difíceis, e que muita coisa aconteceu, então me mande uma coruja quando sentir que está mais disposta.
Estarei aguardando.
Cordialmente,
Minerva McGonagall”
Quando estava prestes a abrir a próxima carta, ouvi batidas leves em minha porta.
- null, querida. Um amigo seu está aqui. – Minha avó disse sem abrir a porta. Já era sábado?
- Tudo bem, vó, pode deixar ele entrar.
Lee era íntimo o suficiente para me ver naquela situação deplorável.
- É a primeira vez que ouço a voz dela em uma semana. – Ouvi minha avó dizer a ele antes dele abrir a porta.
- Oi. – Ele apenas disse, quando estava na minha frente. Eu encarava as cartas abertas em meu colo. Abaixou-se de modo que seu rosto entrasse em meu campo de visão. – null, eu sinto muito.
E me abraçou, fazendo as malditas lágrimas brotarem de novo em meus olhos. Agarrei suas vestes com força e soltei todos os soluços que estavam presos em minha garganta, enquanto ele alisava minhas costas tentando me dar algum tipo de suporte. Chorei alto sem conseguir segurar tudo o que meu peito sentia, e chorei sabendo que ele também sentia aquilo, por mais que conseguisse segurar as lágrimas, ou pelo menos os soluços. Senti seu pulso se mexer um pouco atrás de mim e ouvi a porta do meu quarto fechar lentamente.
Ficamos abraçados até eu conseguir controlar meu corpo.
- Não estou sentindo minhas pernas. – Ele quebrou o silêncio, fazendo-me soltá-lo do abraço dando uma risadinha sem graça entre as lágrimas, só agora notei que ele ainda estava de cócoras.
Ele sentou-se ao meu lado na cama, e segurou minhas mãos.
- null, eu sei que está difícil. Acredite, eu sei. Também perdi meu melhor amigo. – Disse ele, olhando em meus olhos. – Mas você não pode deixar que isto leve a sua vida junto.
- Eu não consigo, Lee.
- Consegue sim. Eu te ajudo. – Apertou minhas mãos com mais força. - Espera aqui um pouquinho.
Ele se levantou e rodeou meu quarto, como se fosse íntimo daquele lugar, abriu a porta do banheiro e entrou lá. Meio segundo depois ouvi o barulho de água e Lee voltou até mim, puxando-me pelos braços. Levantei sentindo minhas costas clamarem por misericórdia.
- Vem, coloquei um energizante na água. Toma um banho e eu te espero aqui. – Ele disse com um sorriso doce.
Lee era uma das pessoas mais alegres e empolgadas que eu conhecia, vê-lo tão calmo e compreensivo comigo era tão estranho quanto ver um centauro que não gostasse de astrologia.
Fiz o que ele pediu, tomei um banho que realmente parecia ter ativos que me deixaram com um sentimento melhor dentro de meu peito. Saí do banheiro e o encontrei com a foto que eu encarava poucos minutos atrás nas mãos.
Ele levantou os olhos até onde eu estava e secou a lágrima que escorregou por sua bochecha rapidamente com a mão, apontou para o seu lado na cama.
- null, eu preciso conversar com você.
Sentei-me ao seu lado, virada de frente para ele.
- George precisa da sua ajuda. – Ele simplesmente disse, como se eu fosse a resposta de todos os seus problemas. É claro que George precisava da minha ajuda, Fred havia me informado aquilo antes da sua morte, e eu fui egoísta o suficiente para não conseguir cumprir a promessa que havia feito. Aquilo me atingiu com uma força que eu não esperava. Meus olhos encheram-se de lágrimas novamente.
- Eu sei. – Disse com a voz embargada. – Me desculpe Lee, eu não quis me fechar desse jeito, eu só... Não tive forças. É o Fred, o meu Fred.
- Não precisa se desculpar, null. Cada pessoa tem um processo de cura com o luto. É normal. – Ele novamente segurou em minhas mãos, atencioso como um melhor amigo deveria ser. Atencioso como eu deveria estar sendo com George.
Ficamos em silêncio por um instante.
- Ele não quer sair do quarto, não deixa ninguém entrar. Nem Sra. Weasley, nem eu, nem Angelina... Todos estão preocupa-
- Eu vou tentar falar com ele. – Interrompi, ouvindo a voz de Fred em minha cabeça. Promete que vai cuidar dele?
***
Aparatei no terreno d’A Toca sozinha, caminhei por alguns metros dentro de um mato alto antes de encontrar a clareira em que a casa se encontrava. Respirei fundo encarando a casa alta e torta que só podia estar em pé por causa de magia, e senti meu coração apertar quando bati os nós de meus dedos na porta grossa de carvalho.
Aquele lugar representava tantas coisas, foram tantas as vezes em que passei minhas férias ali, aprendi a jogar quadribol, ajudei Sra. Weasley a retirar gnomos do seu jardim, ensinei Sr. Weasley a usar vários artefatos trouxas em sua garagem, ajudei Percy a escrever cartas românticas à Penélope (só para depois contar à Fred e George aos risos) e convenci Rony a colocar uma gota da versão de testes do “baba de trasgo” no suco de abóbora de Harry, que ficou pingando uma saliva espessa durante a tarde inteira e compartilhei segredos com Gina.
Sra. Weasley abriu a porta.
- null! - Ela soltou animada e me agarrou pelo pescoço, puxando-me para um abraço aconchegante que apenas uma mãe poderia dar. Me aninhei em seu colo, sentindo o amor que ela transmitia aquecer meu corpo como um bom gole de whisky de fogo.
Novamente senti meus olhos arderem.
- Entre, meu bem. Vou fazer um chá para você. - Entrei pela porta, vendo a casa estranhamente vazia. Aquilo fez meu peito doer novamente. A Toca nunca esteve tão silenciosa. - Como você está? Sente, sente.
Eu sabia que Molly estava destruída por dentro, que ela estava tão devastada e quebrada quanto qualquer outro naquela casa, mas sua casca era dura e resistente como uma mãe de sete filhos deveria ser.
- Eu… Estou bem. - Menti, não queria que ela se preocupasse comigo, já tinha tantas preocupações, tantos desafios a serem enfrentados, a última coisa que eu queria era que perdesse um espacinho que fosse pensando em como eu estava ou deveria estar.
- Não precisa mentir para mim, querida. - Seu sexto sentido materno de sempre funcionou muito bem comigo. Mesmo assim, decidi ficar em silêncio enquanto ela acendia o fogão com sua varinha.
- Onde estão todos? - Perguntei mudando de assunto.
- Ahh, Arthur e Percy estão no Ministério, Ron, Hermione, Gina e Harry estão em Hogwarts, ajudando com os reparos do castelo. E George… - Ela suspirou, olhando para o nada. - George está no quarto. Ele não sai mais de lá.
Sra. Weasley sentou-se na cadeira em frente à minha, o semblante exausto denunciava as noites mal dormidas.
- Sra. Weasley, eu quero que você me desculpe.
- Pelo que, minha filha?
- Por eu não ter vindo antes, eu… Eu também estava em um lugar horrível e precisei de um empurrãozinho para conseguir sair. Me desculpe por largar vocês aqui assim. É só que… Eu amava demais o seu filho, acho que ainda não consegui entender muito bem como é que vai ser a minha vida a partir de agora. - Admiti insegura, olhando minhas mãos sobre a mesa ao invés de encará-la.
- null, você não precisa se desculpar por nada! Eu sou grata em saber que meu Fred se foi sendo amado pela pessoa que ele também amava. - Ela foi a segunda pessoa que segurou em minhas mãos hoje. - Você é da família, querida, você sempre foi.
- Eu… - E lá estavam as lágrimas traiçoeiras novamente. - Obrigada Sra. Weasley, isso significa muito para mim.
Molly acariciou meu rosto e secou a lágrima teimosa que insistiu em descer. Levantou-se com calma quando a chaleira começou a chiar e preparou duas xícaras de chá fumegante para nós.
- Você acha que George vai querer falar comigo? - Perguntei incerta, bebendo o chá delicioso que ela havia preparado.
- Eu espero que sim, querida. Você é minha última esperança, Angelina esteve aqui duas vezes e ele não quis desbloquear a porta. Lee também tentou, mas sem sucesso. - Sra. Weasley suspirou fechando os olhos. - Não sei mais o que fazer…
- Eu vou dar um jeito nisso, eu prometo.
Se eu soubesse que sair de casa e falar com Sra. Weasley iria me fazer tão bem, teria vindo antes. Tudo naquela casa me lembrava Fred. Eu nunca tinha ido ali sem que ele estivesse junto e saber que George estava lá também, e provavelmente em uma situação pior do que a que eu estava era de partir o coração. Nesse momento lembrei de Lee me falando que cada um tem um processo de cura do luto diferente, e sendo filha única, eu nunca entenderia o que é perder um irmão. Nunca.
Não é porque Sra. Weasley está sendo simpática e doce comigo, que ela não está sentindo a dor da perda de um filho. Eu perdi um melhor amigo e um namorado. George perdeu o melhor amigo e um irmão. Nada nunca iria suprir aquela perda.
Terminei meu chá e olhei cúmplice a ela enquanto me encaminhava para a escada que dava aos quartos. Subi os degraus lentamente, sentindo meu coração pulsar em minha garganta e náuseas que enchiam minha boca de saliva e deixavam minhas mãos suando frio. O nervosismo era gritante. Tinha medo de que George também não quisesse falar comigo, e principalmente, tinha medo de falhar na única promessa que fiz à Fred.
Cheguei na porta do quarto dos gêmeos com o coração na mão. Eu tinha que estar preparada psicologicamente para muitas coisas, a primeira e mais importante era de saber lidar com George, acolher e amparar qualquer uma de suas angústias, a segunda era conseguir entrar no quarto de Fred sem deixar aquilo me abalar de forma que eu não conseguisse dar a devida atenção a George e a terceira era que eu não estava preparada psicologicamente para nenhuma dessas opções. E mesmo assim bati na porta.
- Forge? - Falei para a porta ainda fechada. - É a null. Posso entrar?
O silêncio ensurdecedor manteve minhas pernas firmes onde estavam. Bati mais uma vez.
Nada.
Peguei minha varinha contrariada. Eu não queria usar magia para entrar no quarto, era uma falta de ética tremenda, pela invasão de privacidade, pela completa falta de noção e pelo fato de que outras pessoas provavelmente já haviam tentado fazer aquilo e falharam. George provavelmente trancou a porta com um feitiço mais poderoso do que um simples:
- Alohomora. - Sussurrei para a porta que destravou com um clique.
Empurrei a porta devagar até o final. George encontrava-se deitado na cama de Fred, encolhido como um filhotinho, os joelhos apertados contra o peito e as mãos abraçando as pernas.
Senti meu corpo fraquejar por um segundo, vendo-o daquele jeito. Em meu peito uma sensação triste de traição, por não conseguir ter ido antes até ele, dar o apoio que ele precisava.
Ao contrário do que eu imaginei, o quarto estava com as janelas abertas e bem arejado, o cheiro de fumaça era forte ali dentro, e um misto do cheiro de Fred e George me abraçou como o cheiro de torta recém assada. Minhas pernas amoleceram e me vi obrigada a me apoiar no batente da porta antes de entrar completamente no quarto. Tranquei a porta.
- Hey, grandão. – Me agachei em sua frente e pude finalmente ver seu rosto contra a luz do sol que entrava pela janela.
George estava péssimo. Os olhos fundos rodeados de olheiras arrocheadas, as bochechas antes bonitas e coradas, agora tinha sulcos abaixo das maçãs do rosto, seus cabelos estavam opacos e sem o brilho vermelho habitual, seu olhar era vazio, como se nem percebesse que eu estava realmente ali.
- Georgie. – Minha voz saiu afetada pelo nó que se fechava em minha garganta; enquanto as lágrimas brotavam em meus olhos vendo a situação em que eu deixei meu melhor amigo chegar.
- Georgie, eu estou aqui e não vou a lugar algum.
Dei a volta na cama, enfiando-me entre ele e a parede e o abracei por trás, encaixei meu braço por baixo do seu, enlacei sua cintura com minha perna, beijei o topo de sua cabeça e apenas fiquei ali, ouvindo sua respiração, sentindo a pulsação do seu coração e tentando sugar de qualquer maneira, um pouco da sua dor para mim.
Perdi a noção de quanto tempo fiquei assim até que George se desse por vencido e se movesse na cama, virando-se de frente para mim. Ele não disse nada e muito menos eu, ao invés disso, passou os braços em volta do meu tronco, puxando-me mais para perto, agarrou a malha da minha blusa como se sua vida dependesse daquilo, enterrou seu rosto em meu pescoço e chorou.
Chorou do mesmo jeito que eu havia chorado com Lee, um choro alto e descontrolado, com soluços que o deixavam sem ar por alguns segundos até ele conseguir respirar.
Acariciei seus cabelos, enquanto deixava as lágrimas lavarem meu rosto novamente, não sei como era possível que meu corpo ainda tivesse capacidade de criar novas lágrimas, mas ali estavam elas.
Fiquei ali até ele parar de chorar e pegar no sono, já era escuro lá fora quando isso aconteceu, mas eu não fazia ideia de que horas eram. Fechei a janela do quarto, peguei uma manta dentro do guarda-roupas e coloquei por cima dele, dei um beijinho em sua têmpora e saí do quarto.
A família Weasley estava reunida na mesa de jantar, Hermione e Harry estavam também. Todos me olharam com expectativa quando desci o último degrau da escada e Gina correu para me abraçar quando me viu. Respirei fundo para não chorar mais uma vez.
- Ele está bem. – Falei por fim, um suspiro cansado acompanhou a minha voz.
Todos respiraram aliviados, Gina me puxou para sentar ao seu lado na cadeira que normalmente era minha quando eu ia passar as férias lá.
- E você, como está? – Hermione perguntou, acariciando meu antebraço. O olhar de todos recaiu sobre mim mais uma vez.
- Eu estou... – Eu iria mentir novamente, não precisava berrar aos sete cantos que estava despedaçada por dentro, todos ali sabiam disso e todos ali sentiam-se do mesmo modo. Seria redundante ficar repetindo esses passos toda vez. Antes de eu conseguir terminar minha frase, vi o olhar de Molly para mim, sua cabeça balançou negativamente como se dissesse “Não precisa mentir para a sua família”. – Na verdade não sei como eu estou.
- Coma um pouco, meu bem. – Sra. Weasley disse do outro lado da mesa.
O clima da mesa era denso, silencioso e preocupado. Ninguém se atrevia a falar mais do que uma frase e depois do jantar, pedi a Sr. Weasley para usar o seu telefone (pouquíssimo utilizado naquela residência) para eu avisar minha avó que passaria alguns dias ali.
Pedi a Molly que fizesse uma sopa, e que deixasse sob o fogão que mais tarde eu tentaria convencer George a descer e comer um pouco. Ela me agradeceu com o olhar, e eu não precisava de nada mais do que aquilo.
Voltei às escadas e subi até o último quarto antes de voltar ao quarto dos gêmeos. Cumprimentei cada um devidamente, os quatro estavam sentados no chão, Rony e Mione estavam abraçados, Harry e Gina também, não havia muita conversa envolvida no momento, eles estavam apenas curtindo a presença um do outro, e dando o suporte necessário, afinal Rony e Gina também haviam perdido o irmão. Todos nós perdemos muitas pessoas, amigos, colegas, parentes, professores... Conversamos coisas banais, perguntei como estava em Hogwarts e eles me contaram em poucas palavras.
Quando saí do quarto de Rony para deixá-los mais à vontade, ouvi a voz dele me chamar.
- Obrigado por estar fazendo isso.
- Isso o quê?
- Cuidando de George, você sabe.
- Não estou fazendo nada que nenhum de vocês não fariam um pelo outro. – Falei apontando para cada um.
Voltei ao quarto dos gêmeos, a porta agora estava destrancada e tenho certeza de que Sra. e Sr. Weasley vieram espiar o filho antes de irem ao seu quarto. Roubei um par de meias grossas no guarda-roupas, e deitei-me junto com George mais uma vez. Seus braços me envolveram quase que imediatamente e peguei no sono ouvindo sua respiração regular e calma de quem estava em sono profundo.
O sono foi leve e cada vez que George se mexia eu abria os olhos para me certificar de que ele estava bem. Me peguei fazendo carinho em seu cabelo vez ou outra, como eu fazia em Fred quando sentávamos na beira do lago para conversar sobre qualquer coisa. Levantei, mesmo estando exausta, para tomar um copo de água e respirar um pouco.
Sentei na cadeira que normalmente Fred usava, ao lado da minha e perdi a noção de quanto tempo fiquei ali com meu copo de água nas mãos, intocado.
Era impossível não me pegar pensando nele.
Seu cheiro agora estava impregnado em minha roupa e por um segundo me senti abraçada novamente, respirei fundo tentando controlar as emoções em meu coração. O vazio que eu sentia dentro de meu peito parecia que nunca mais seria preenchido, era a dor mais íntegra que jamais pensei em um dia sentir. Me peguei chorando silenciosa quando ouvi passos descendo as escadas.
- null? - Era a voz de Potter.
- Ah, oi, Harry. - Minha voz saiu mais chorosa do que eu esperava.
Ele veio até mim e sentou-se ao meu lado.
- Não está sendo fácil, não é? - Perguntou ele, sem realmente esperar uma resposta. Ele também havia perdido algumas pessoas, e sabia exatamente pelo que eu estava passando, sabia também que a amizade era indispensável nesse momento. Ele estava ali por Gina e Rony.
- Não. Não achei que fosse ser tão difícil. - Admiti suspirando. Eu sempre tive uma intimidade com Harry que nunca tive com Rony e Hermione. Gosto de pensar que o fato de sermos órfãos ajudou nesse processo de aproximação, mas é claro que termos melhores amigos da mesma família ajudou também.
- Você vai conseguir, tá bem? Vai passar, eu te prometo. As vezes demora mais do que a gente quer. Mas passa. - Ele acariciou meu antebraço. Pus minha mão sobre a dele.
- Obrigada, Harry, sei que não está sendo fácil para você também. - Suspirei.
- Não está, é verdade. Mas vou te admitir algo que está preso dentro de mim e não tive coragem de falar para ninguém: estou tão aliviado que tudo isso finalmente acabou, que não consegui digerir as perdas ainda. Estou com a mente tão ocupada lá na escola, que não tive tempo de parar e chorar, sabe? Isso é muita insensibilidade?
- Cada um lida com a perda de um jeito. - Parafraseei Lee. - Não se martirize por isto, Potter, se você não chorou ou não perdeu o apetite, não quer dizer que você é uma má pessoa. Você é só humano. - Tentei ser o mais sensata que eu pude, e o garoto se abalou um pouco.
- Eu só não consigo tirar da cabeça que todas essas pessoas morreram por minha causa. - Sua voz saiu esganiçada, presa por uma angústia palpável.
- Não. Não foi sua causa, todos que estavam lá queriam lutar contra Você-sabe-quem. Todos sabiam das consequências, todos decidiram ir. Harry, você tem que parar de se culpar pelas coisas que ele fez, só porque você era o Escolhido.
- Eu entendo o que você diz. Só não consigo visualizar dessa maneira.
- É a maneira certa. Logo você vai conseguir compreender isso. Não foi culpa sua, nada disso. Nada teria sido diferente se outra pessoa fosse a escolhida. Teríamos lutado do mesmo jeito. - Continuei defendendo-o de seus próprios demônios. - Com certeza ser seu amigo ajudou muito nesse processo, mas não considere como culpa. Porque não é.
- É, você está certa.
- É claro que estou. - Brinquei e ele sorriu fraco.
- Eu sinto muito pelo Fred. - Harry disse depois de alguns minutos de silêncio.
Apenas suspirei, finalmente tomando um gole da minha água.
- Dói muito, sabia? Eu não perdi um namorado, eu sinto que perdi minha família. E eu sei que tu és um dos poucos que entende esse sentimento.
- Sim, eu sei exatamente o tipo de dor que você está sentindo. – Harry aproximou sua cadeira da minha e me abraçou de lado, deitando sua cabeça em meu ombro. – Mas vai passar, estamos todos aqui para isso, para curarmos uns aos outros.
Ficamos abraçados por alguns minutos, em silêncio.
- Estou preocupada com George.
- Ele vai sair dessa, mas ele precisa de você, null. – Harry soltou nosso abraço. – Ele tem uma conexão contigo, não tem com Lee e nem com a Angelina. É você. Estamos a semana inteira tentando abrir a porta do seu quarto. Ele pôs algum feitiço que nem mesmo Hermione soube dizer qual era, só você conseguiu abrir.
- Acho que sei o que pode ter sido. – Falei, levando minhas mãos até meu pescoço e retirando a correntinha prateada que Fred me deu antes da batalha de dentro de minha blusa. – Fred me deu no dia da batalha.
- Brilhante! – Harry exclamou, costume que pegou de Rony. – Ele devia te amar bastante, para te confiar essa tarefa.
- Eu só tenho medo que eu não esteja preparada para essa tarefa.
- Está sim, George confia em você. E Fred também confiava, se não ele não te daria isto. – Indicou a corrente que provavelmente tinha algum tipo de magia que abriu a porta do quarto deles e guardei-a por dentro da blusa.
- Você tem razão.
- É claro que tenho. – Ele brincou e empurrei seu ombro antes de me levantar.
Ele me acompanhou até a porta do quarto dos gêmeos e me abraçou mais uma vez antes de seguir ao quarto de Rony.
Entrei no quarto e me aconcheguei ao lado de George, segurei minha correntinha na mão antes de pegar no sono, confiante de que se Fred havia me pedido para ajudar George, era porque ele depositava em mim uma confiança extraordinária.
Flashback – 01 de setembro de 1989 – Estação King’s Cross.
- Com licença. – Minha avó abordou um homem de pele negra que estava com o filho que parecia ter a minha idade. O homem parou e nos deu atenção, e segurou a mão do garoto que guiava um carrinho com uma bagagem um tanto excêntrica, assim como a minha, não havia dúvidas de que eles eram bruxos a caminho de Hogwarts assim como eu. – O senhor também está indo até o Expresso de Hogwarts? – Vovó sussurrou a última parte, olhando para os lados com medo de que o homem a achasse uma lunática. Segurei um risinho enquanto notei os olhos do garoto em mim, ele tinha os cabelos despojados com dread locks curtos, usava vestes compridas que eu só tinha visto igual quando fomos comprar meu material escolar no Beco Diagonal.
Eu usava roupas comuns, calça jeans e um suéter fino azul claro que minha avó me obrigou a usar com medo de que eu passasse frio durante a viagem.
- Ah sim, estou. Você nunca foi até lá? Deixe-me adivinhar, são trouxas? – Perguntou o homem em um tom divertido. Minha avó suspirou aliviada por ter encontrado de primeira, alguém que fosse capaz de nos ajudar
- Sim, eu sou, mas minha neta, null, não. E é por isso que estou um pouco perdida com essa passagem de trem. - Falou ela, abanando a passagem no ar.
- É bem confuso para os principiantes mesmo. Mas se vocês quiserem me acompanhar, eu mostro como funciona.
- Seria de grande ajuda! Obrigada. – Ela disse e acompanhamos o homem e o garoto.
- Bom, sou Eddard Jordan. – O homem esticou a mão até minha avó que a apertou com simpatia. – E este é meu filho Lee.
- É um prazer, sou Lucille null. E esta é minha neta null.
Estiquei minha mão com certa cordialidade desnecessária até o garoto que apertou meio sem graça.
Seguimos até parede de tijolos que compunha o arco entre as plataformas nove e dez, e Eddard explicou como funcionava a entrada. Ainda com um pouco de receio, nós duas fizemos o que o homem explicou, logo atrás deles.
Ainda era difícil de acreditar que tudo aquilo ali era real, a passagem pela parede de tijolos, o trem gigantesco que nos aguardava já ligado, ou a quantidade de pessoas andando para um lado e para o outro, crianças e adultos se misturando em grande quantidade, tudo parecia realmente mágico. Me despedi de minha avó quando vi que Lee estava abraçando seu pai, entregamos nossas bagagens juntos em um vagão específico para isto e seguimos para dentro do trem à vapor.
Por mais que fosse um bruxo nascido em uma família de linhagem bruxa, Lee mostrava bastante nervosismo em deixar o pai e subir no trem. Fingi não notar como ele ficou abalado quando entrou, e o acompanhei pelo corredor, tentando o distrair, comentei:
- É melhor quando tem alguém junto, não acha? É menos assustador.
Andamos alguns vagões cheios de alunos mais velhos, até encontrarmos uma cabine vaga e corremos para a janela para darmos um último adeus à nossa família. Minha avó acenou docemente, enxugando uma lágrima que desceu por sua bochecha. Eu sorri tentando deixa-lla mais calma.
- Você acha que é muito longe? – Lee perguntou ansioso, olhando pela janela que agora mostravam um lindo campo verde, o dia era ensolarado e fresco.
- Não faço ideia! Eu sou a nascida trouxa aqui. – Dei uma risada, e ele riu junto dando um tapa na testa.
- Verdade, esqueci de fazer este tipo de pergunta ao meu pai. – Ele refletiu. – Você acha que vamos ser selecionados para a mesma casa?
- Casa? Do que você está falando?
- Ah, por Merlin, esqueço que você não sabe nada sobre Hogwarts!
Lee entrou em uma conversa animada sobre as casas da escola, explicou as características de cada uma e disse que seu pai era da Corvinal e sua mãe da Lufa-lufa.
Enquanto a gente conversava animados sobre nosso futuro na escola, dois garotos entraram na cabine: Ambos tinham cabelos ruivos e eram idênticos.
- Estamos fazendo um teste. – O ruivo da esquerda disse, ele era pouca coisa mais alto do que o seu gêmeo.
- Um teste oficial da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. – O outro completou animado, uni as sobrancelhas em desconfiança enquanto eles ficavam mais à vontade na cabine.
- Que tipo de teste? – Lee perguntou, olhando de soslaio para mim, sua expressão era tão desconfiada quanto a minha.
- É bem simples. – O ruivo da esquerda falou enquanto pegava em suas vestes um pacote de tirinhas de jujubas já aberto.
- Cada um de vocês têm que pegar uma jujuba e comer. O sabor da jujuba dirá se vocês estarão aptos a fazer o teste das casas quando chegarem em Hogwarts. – O ruivo da direita disse, sentando-se ao meu lado, como se me conhecesse há bastante tempo, enquanto o outro fazia o mesmo sentando ao lado de Lee.
- Isso não me parece nem um pouco verdadeiro. – Deixei escapar, unindo as sobrancelhas, encarando o pacote aberto de jujubas e depois olhando para o gêmeo que estava ao lado de Lee.
- Não precisa acreditar, apenas lembre-se de mais tarde ir falar com o Diretor Dumbledore sobre como você se negou a fazer um simples teste de triagem para a seleção das casas. – O gêmeo ao meu lado disse, dando de ombros.
Pensei por um segundo. Tinha certeza de que era uma pegadinha, não existia a menor chance de que aqueles dois garotos tão jovens quanto eu, teriam sido encarregados de algo tão importante. Mesmo assim, poderia ser divertido fazer algumas amizades a mais do que Lee. Afinal, e se não fossemos para a mesma casa? E o que poderia ter de tão ruim naquela jujuba?
Sem falar nada, arranquei uma jujuba do pacote e no exato instante em que meus dentes deram a primeira mordida, a jujuba explodiu com um estalo seco, sumindo de minha mão e da minha boca, deixando um gosto de fumaça no lugar. Quando abri os olhos ainda pude ver a fumaça se dissipando. Engoli seco por conta do susto, e a cabine ficou em silêncio por um segundo, todos esperando a minha reação. Decidi que não ficaria brava, afinal quem pegou a jujuba fui eu, e sem mais nem menos, dei uma gargalhada alta, desatando a rir descontroladamente vendo o rosto dos garotos que ainda estavam em choque pela minha reação. Poucos segundos depois, os três meninos caíram na gargalhada.
- Eu amei! Quero fazer com alguém. – Eu disse ainda entre risos. – Já fizeram em alguma outra cabine?
- Não, vocês foram os primeiros. – O gêmeo ao meu lado disse, enxugando a lágrima que escorria por seus olhos de tanto rir.
- Por quê? – Lee perguntou curioso, o sorriso ainda estampado no rosto.
- Era a cabine mais vaga, queríamos lugares para sentar durante a viagem.
- Queriam lugar para sentar e fizeram isso?! – Perguntei indignada, porém de maneira leve.
- Ah, era para quebrar o gelo. – O gêmeo ao meu lado esbarrou o ombro no meu, sorrindo ladino.
- Tudo bem, vocês conseguiram. – Me dei por vencida, ainda dando risos escassos que fugiam de minha boca sem controle.
- Sou Fred. E esse é o George. – O gêmeo ao lado de Lee disse.
Nos cumprimentamos de verdade dessa vez, e os três me ajudaram a limpar o rosto esfumaçado para colocarmos o plano de enganar mais cabines com as jujubas em ação.
A viagem quase inteira nós quatro ficamos enganando outros alunos nas cabines, sempre variando a dupla para que ninguém desconfiasse. As jujubas surpresa que os gêmeos levaram, variavam entre explodir, gritar, soltar fumaças com cheiro de pum, entre outros. Não demorou muito para ficarmos conhecido dentro do vagão.
E demorou menos tempo ainda para percebermos que aquela amizade seria duradoura.
Um mês havia se passado desde a morte de Fred.
Um mês sem a porra da minha alma gêmea.
Um mês que estou sem sair de casa ou receber visitas.
Um mês que null está dormindo comigo.
Um mês que não falo com Angelina ou Lee.
Meu peito ainda ardia, ferido e completamente vazio, meus dias se limitavam em ficar no quarto e ir até a cozinha comer com a minha família. Ninguém dirigia muitas palavras a mim, depois de algumas semanas trancado no quarto isolado, eles perceberam que eu não queria conversa. Aos poucos fui soltando a linha imaginária que me prendia, abracei minha mãe, pisquei para meu pai, acariciei o braço de Gina alguns dias atrás e joguei uma partida de xadrez de bruxo silenciosa com Rony, nenhum deles fazia movimentos bruscos quando eu fazia algo assim, como se eu fosse um gato maltratado na rua que estava devagarinho se habituando ao novo lar.
Harry tentou trocar algumas palavras comigo ontem, mas o dispensei tentando ser o menos rude possível. null se encarregava de explicar a situação a todos.
Eu só conseguia falar com ela.
Talvez fosse o fato de Fred simplesmente confiar a sua vida a ela, se fosse possível, ou o fato de eu conhecê-la tão bem... Eu apenas sentia que podia falar qualquer coisa e ela entenderia. null me entendia, porque ela também perdeu a alma gêmea naquele dia.
- Você está bem? – Ouvi minha voz dizer antes mesmo que eu percebesse, estava amanhecendo lá fora, e null entrava no quarto sorrateira, assustando-se com minha voz.
- Estou sim, só precisava de um ar. – Ela disse sentando-se em minha cama. – E você?
- O mesmo de sempre. – Dei de ombros debaixo das cobertas e ela sorriu com a boca fechada, mas os olhos eram tristes.
- Vem. – Ela disse, esticando o braço para mim, fazendo um sinal de “vem” com os dedos. Eu confiava nela o suficiente para apenas esticar minha mão até ela e deixar que me guiasse.
- Segura a coberta. – Avisou, e fechei minha mão livre na manta de retalhos que minha mãe havia feito há alguns anos, antes de sentir meu umbigo ser puxado para dentro, como se um gancho estivesse em meu intestino, meu corpo ficou fluido e viajei para onde quer que null estivesse me levando. Aparatamos.
Senti meu corpo rígido quando meus pés pousaram no telhado da garagem de papai.
O nascer do sol estava lindo.
O céu tinha tons rosa forte e laranja misturando-se em uma harmonia perfeita, não havia nuvens e não fazia frio, mas uma brisa gelada batia em nossas costas, deixando o verão mais gostoso do que de costume, o tempo estava úmido como se tivesse chovido algumas horas antes e o sol surgia à nossa frente, o campo de mato amarelado cobria toda a nossa vista, até as colinas que agora estavam se iluminando com os raios solares. À nossa esquerda havia um lago coberto de vitórias-régias e alguns pomares e hortas que minha mãe cultivava, à nossa direita estava A Toca, a residência fixa dos Weasley’s, a casa mais desengonçada já vista no mundo bruxo, porém, o lar mais aconchegante que qualquer um poderia conhecer.
null cobriu nossas costas com a manta, mesmo que o calor já estivesse querendo dar as caras e ali ficamos, observando o sol subir com uma lentidão gostosa de acompanhar, abraçados às nossas pernas, curtindo a presença um do outro.
- Quando você pretende falar com Angelina, Georgie? – Ela quebrou o silêncio depois de algum tempo.
Angelina e eu estávamos engatados em um relacionamento desde que saí de Hogwarts. Eu gosto dela, gosto de sua companhia e por fim, gosto de como nosso relacionamento estava. O problema ali era eu, eu não estava em um momento em que me via em um relacionamento sério que fosse saudável ao mesmo tempo. Esse mês foi prova disso, não troquei uma só carta com ela e sempre que ela ia me visitar, eu preferia ficar trancado no quarto ao invés de ter sua presença. Não consigo pensar em um motivo definido, mas eu não conseguia mais pensar em Angelina como minha namorada. Eu precisava dizer isso a ela, mas não sabia como. Eu precisava do meu tempo e do meu espaço para me recuperar. Não podia ficar pensando em relacionamentos agora, não podia e não queria.
- Eu realmente preciso falar com ela?
- Bom, ela é sua namorada. Eu gostaria que você tivesse a decência de conversar com ela. – Explicou ela, a voz ligeiramente incisiva, do jeito que ela falava conosco quando queria nos dar uma bronca. Fred adorava quando ela fazia aquilo, eu particularmente achava irritante, principalmente quando era para me dar uma bronca.
- Não sei se estou pronto para ter esse tipo de conversa com ela. – Respondi com sinceridade.
- Eu sei que não é fácil, mas ela precisa saber como você está, o que você sente em relação a ela e se vocês estão realmente namorando, afinal, faz um mês que você não fala com ela.
- Eu sei, eu sei.
- O que você sente em relação a ela, George? Você precisa colocar estes sentimentos em ordem.
- Eu acho que não estou pronto para um relacionamento agora. – Suspirei, arrancando os fiapinhos soltos da colcha de retalhos, distraído.
- Então você precisa dizer isto a ela. Ela merece. – null disse acariciando meu ombro como se aquilo fosse me acalentar de alguma maneira.
- O que eu digo?
- Diz a verdade. Ela é, acima de tudo, sua amiga. Ela vai entender. – Ela parou de acariciar meu ombro e enganchou o braço no meu, deitando a cabeça em meu ombro olhando para frente.
- Você acha que ela vai entender? Eu fui um péssimo namorado nas últimas semanas.
- Eu tenho mantido ela e Lee bem informados, é claro que ela vai entender. Georgie, eles também perderam um amigo.
- Eu sei, mas... Não é a mesma coisa. Você sabe. – Olhei sua cabeleira castanha sob meu ombro.
- Não devemos desmerecer alguém por conta disso. - Sua voz era calma e lenta, como se não quisesse me ofender de alguma maneira.
- Você está certa.
- É claro que estou, e continuo achando que Angelina merece muito mais do que isso. Não estou querendo dizer que você está sendo ruim para ela, mas ela precisa de atenção. Qualquer relacionamento precisa de suporte e cuidado. - null sempre tinha as palavras certas. Sempre. Às vezes era surpreendentemente irritante, pois a deixava convencida, mas a null convencida acabava sendo tão amável quanto qualquer outra versão dela. E eu adorava todas as suas versões, inclusive a versão que esteve até agora comigo, sofrendo este luto terrível que nos consome de maneira inexplicável. E o pior de tudo: ela estava novamente certa.
- Vou falar com ela. Prometo. Só preciso pensar em como faço isso.
- Eu posso ir contigo, se você se sentir mais confortável.
- Não precisa. Posso fazer isso. – Respirei fundo. Seria a primeira vez que sairia realmente de casa.
- Tudo bem. Mas se você precisar de algo, estarei aqui. - null aconchegou-se mais, agarrada em meu braço.
- Na verdade, eu preciso. – Falei fechando os olhos, sabendo que ela iria me encarar com os olhos castanhos preocupados, aquela ruguinha de preocupação no meio das sobrancelhas.
Conforme previ, senti ela soltar meu braço e quando abri os olhos a garota me olhava atentamente.
- Eu gostaria de trocar a cor dos meus cabelos. – Falei nervoso, enquanto olhava o céu ficar mais claro e menos rosado a cada minuto que se passava.
- Como assim?
- Ah, null. Não me faça ter que explicar isso. – Respondi encabulado. – Eu só não quero mais ter que me olhar no espelho e ver... ele. É doloroso demais.
Os olhos dela se arregalaram, como se tudo fizesse sentido. Ela provavelmente estava tendo uma epifania de todos os momentos em que eu entrava no banheiro e acabava chorando sem motivos aparentes, ou de todas as vezes em que ela entrou no banheiro e viu o espelho tampado com uma toalha.
- Georgie... – Seus olhos agora brilhavam de uma maneira que eu, infelizmente, conhecia bem. – Você tem certeza?
- Tenho. Você acha que um castanho como o seu ficaria bom? Não gosto de loiro. – Respondi tentando distrai-la. Seus cabelos eram castanhos, do mesmo tom dos sapos de chocolate que comíamos no Expresso de Hogwarts todo dia 1º de setembro.
Ela fungou tentando se recompor.
- Acho que pode ser um pouco mais escuro. Se for muito claro, pode ficar avermelhado ainda.
Ela ainda me olhava desacreditada, como se eu estivesse brincando com ela ou algo do tipo, mas estávamos em um patamar onde eu nem conseguia brincar direito ainda.
- Entendi. E você sabe alguma poção que faça isso? Ou um feitiço. – Perguntei novamente caçando fiapinhos na manta, tentando não manter contato visual com ela naquele momento. Eu já sentia minha garganta embolada apenas de ver seus olhos marejados.
null não merecia aquilo.
- Não sei. – Fungou. – Mas sei pintar o cabelo no estilo trouxa. Minha avó pedia para que eu pintasse seu cabelo em todas as minhas férias e feriados que eu passava com ela.
- Você acha que funciona?
- Claro! Só tem que retocar uma vez a cada um mês ou dois, depende do crescimento do seu cabelo.
- Isso parece cansativo. – Exclamei espiando-a, e notei que ela fazia trancinhas na franja da manta.
- Posso falar com a Hermione, tenho certeza de que ela sabe algum feitiço que...
- Não, vamos fazer no método trouxa. Do que precisamos?
- Precisamos ir à uma farmácia, ou um supermercado e comprar um kit para pintura de cabelo.
- Entendi. – Fingi que sabia o que eram estas coisas, não queria ficar importunando. – E você tem dinheiro de trouxa?
- Claro. Sou nascida trouxa, G.
Eu sabia daquela informação, mas null gostava de compartilhá-la sempre que possível, ela tinha um entusiasmo intrínseco de mostrar suas origens e como conhecia tão bem os dois mundos. Eu entendo perfeitamente, pois adorava enganá-la quando era mais novo, inventando qualquer coisa sobre o mundo bruxo apenas para que ela achasse que era verdade e acabasse passando por algum aperto. Fred costumava fazer isto com mais frequência do que eu e null sempre caía como uma patinha e sempre levava na esportiva. Era o que a gente mais gostava nela: sua inocência trouxa, sua curiosidade acima da média e sua risada frouxa quando descobria que havia sido enganada por nós. Às vezes eu desconfiava de que ela sabia que seria alguma pegadinha, mas fazia do mesmo jeito para conseguir nos conhecer melhor, e ela conheceu. Conheceu ao ponto de conseguir prever nossas ações antes de fazermos, era uma das garotas mais brilhantes que já conheci.
Ficou combinado que eu iria na casa de Angelina sozinho, teria aquela conversa com ela e depois eu voltaria para irmos até a tal farmácia comprar o produto que tingiria meus cabelos permanentemente.
- Você está bem? – A voz de null me despertou de um nervosismo acima da média. Respirei fundo.
- Não.
- Você não precisa fazer isso agora, Weasley. – Eu não gostava quando ela me chamava assim. Não era íntimo o suficiente.
- Eu sei. Mas tenho que fazer. Preciso sair da minha concha, encarar a realidade um pouco.
Seus olhos estavam marejados novamente, mas dessa vez era de uma felicidade genuinamente orgulhosa.
- Tem certeza? – Perguntou tentando esconder um sorrisinho, falhou.
- Sim, null, eu sei que você está orgulhosa de mim. Pode sorrir. – Falei virando os olhos para cima, segurando suas mãos que estavam esticadas na minha direção, para que eu me levantasse da cama. Enquanto eu fazia isso, ela sorria feito uma bobalhona.
- Estou orgulhosa de você.
- Eu sei, mãe.
Eu gostava de como minha personalidade estava voltando aos poucos ao meu corpo, como se eu tivesse tomado um banho quente e revigorante, removendo um pouco da sujeira que me mantinha recluso.
Bati na porta da casa de Angelina. Aguardei ser atendido com as mãos atrás do corpo, olhando distraidamente o jardim da casa, com uma grama muito verde e bem cuidada, uma árvore bonita e aparada no centro, as folhas formando um desenho redondo perfeito.
- George? – A voz de Angelina me retirou do transe e antes mesmo de eu virar de frente para ela, a garota agarrou meu pescoço.
Envolvi seu corpo com meus braços compridos e ficamos assim por um tempo, apenas sentindo um ao outro.
Ela me fazia me sentir menos babaca, mesmo quando eu estava sendo um babaca com ela. Que tipo de namorado ficava sem dar notícias por um mês? Eu sei que tinha um motivo, que até poderia ser considerado plausível por alguns, mas depois de alguns dias pensando, não era de maneira alguma aceitável, ainda mais quando a sua namorada era uma amiga de longa data que conseguiria entender o que você está passando.
Por algum motivo por mim desconhecido, o seu abraço não me despertou aquela vontade repentina de chorar, mesmo quando ouvi seu fungar tristonho ao pé de meu ouvido.
- Como você está? – Ela perguntou quando nosso abraço se desfez e ela limpou as lágrimas com a mão.
Ela me chamou para sentar em um banco branco que havia na varanda.
- Estou bem. – Menti, era mais fácil assim. – E você?
- Estava preocupada com você. Meu Deus, George, você tem noção de como nós ficamos?
- Na verdade, não. Me desculpe por isso Angel, eu só... Não consegui pensar em nada.
- Você não precisa se desculpar, George. – Ela disse acariciando minhas mãos, um sorriso doce nos lábios.
- Eu preciso sim. Me desculpe por ter sido tão... babaca. Não consigo pensar em outra palavra que descreva isso. Fui um babaca contigo. – Respondi correspondendo seu carinho.
- Você realmente não preci-
- Angel, eu acho que vai ser melhor para nós dois se terminarmos. – Não consegui deixá-la terminar, não quando aquilo estava entalado na minha garganta.
- O quê? – Era nítido que ela foi pega completamente de surpresa, isso era o que mais me doía, pois se ela estivesse brava por meu afastamento, esse término seria mais fácil.
- Eu não estou em um momento muito bom da minha vida. – Tentei explicar, entretanto não saiu exatamente do jeito que eu havia planejado. – Sinto que preciso de um momento para conseguir recuperar completamente o rumo da minha vida.
- George, eu estou aqui. Sou a Angelina, lembra? Posso te ajudar a passar por isso.
- Eu sei que você pode, sei que você é tão maravilhosa a esse ponto, Angel. – Respondi olhando em seus olhos, que voltavam a ficar marejados. Por Merlin, quantos olhos marejados eu iria encarar esta semana? – Mas eu não posso mais fazer isso contigo, você não merece. Você é especial demais para isso, e no momento eu não sou o cara que vai conseguir te fazer sentir especial, não do jeito que você deve se sentir.
- Você está sendo imaturo. Eu entendo tudo que você está passando e estou disposta a encarar isso, juntos. – Vê-la daquele jeito me partia o coração. Logo eu, o cara que estava com o coração despedaçado.
- Desculpe, Angel. Mas eu já me decidi, e penso que nesse momento é a melhor escolha. Não quero te afundar nesse poço de miséria em que minha vida está agora.
- George, por favor, pensa bem. – Seus olhos agora escorriam lágrimas livremente, mas seu semblante não era triste ou bravo, era um rosto decepcionado que eu via me encarando.
- Eu já pensei, não posso mais fazer isso.
- Você tem razão. – Ela disse me encarando com o rosto franzido, tentando segurar o choro. – Você é um babaca.
Aquilo me doeu mais do que eu esperava.
- Angel, eu espero do fundo do meu coração que você entenda que isso vai ser o melhor para nós dois. Eu não posso ser a âncora que te arrasta para o fundo do poço.
- Tudo bem, George. Se você não quer ser ajudado, não tenho como mudar a sua cabeça. – Ela disse irritada, nunca havíamos brigado depois do início do namoro e eu tinha medo da Angelina brava.
- Eu espero que nossa amizade não acabe aqui. – Ainda tive a cara de pau de dizer, fazendo-a me fuzilar com os olhos ainda molhados. Ela levantou indo na direção da porta.
- Não vai acabar, sabe por quê? Porque eu sou uma ótima amiga. Mas não me procure quando se arrepender disso. Nós nunca mais vamos namorar, espero que você entenda isso.
- Eu entendo, Angel. – Falei levantando também.
- Tenha uma ótima vida, George. – Ela disse abrindo a porta.
- Me desculpe por isso. – Respondi imediatamente, antes que ela fechasse a porta na minha cara.
***
null pediu para eu trocar de roupas para ir com ela ao “mundo trouxa” alegando que meu blazer alaranjado não seria bem visto lá. Coloquei uma gola polo listrada colorida (todas as minhas roupas são coloridas demais) e ela me olhou de cima abaixo aprovando meio contrariada.
Aparatamos em um beco sem saída úmido com cheiro de mofo, saímos de lá e pegamos a avenida principal onde as pessoas andavam apressadas pela calçada.
- Estamos aonde?
- Condado de Cornwall, minha avó mora aqui.
Ela me guiou até uma loja grande de esquina, branca e clara demais em minha opinião, entramos e ela seguiu até um corredor como se conhecesse o local com bastante maestria.
O ambiente tinha tantos itens nas prateleiras que fiquei confuso, e ela tinha razão em não me deixar usar minhas roupas usuais, eu já chamava atenção o suficiente por estar com a cara abatida de quem acabou de dar um beijo em um dementador, não ter uma orelha bem definida e ter quase dois metros de altura. Não precisava de roupas coloridas espalhafatosas para completar o look de esquisitão do mundo trouxa.
null, por outro lado, se misturava como um deles usando uma calça jeans e uma blusa preta básica, tinha a altura de uma mulher normal, e por mais que tivesse o rosto abatido, não era nada comparado a mim.
Ela selecionou algumas caixas em suas mãos, havia uma mulher em cada caixa, cada uma delas com uma cor diferente nos cabelos, todas eram castanhas em suas mãos, na prateleira ainda haviam algumas cores diferentes, preto, louro e até vermelho.
- Qual dessas? – Me mostrou as opções que segurava. A diferença era mínima, eu não saberia dizer qual seria a melhor opção.
- É tudo marrom. – Eu disse arqueando as sobrancelhas.
- Eu sei. – Ela deu uma risadinha pelo nariz. Analisou a caixa, colocou ao lado do meu rosto. Pensou. E por fim escolheu uma.
- Qual o veredito? – Perguntei.
- Essa. – Disse me mostrando a caixa do meio. – Não é muito escuro. Seu cabelo é claro, a cor pode pigmentar demais e ficar parecendo preto.
- Não tenho problemas com preto.
- Eu sei que não. Mas você tem olhos bonitos, o preto pode escurecer demais o seu contraste. – Ela explicou séria, e eu a olhei em tom de dúvida. – Seus olhos podem mudar de cor, e não quero que isto aconteça.
- Entendi. – Eu ainda não tinha conseguido ler null o suficiente para saber se ela estava feliz com minha decisão de mudança ou não, por um lado penso que faria sentido ela gostar, pois com certeza ela via Fred em mim também. Por outro lado, tenho medo de que ela perca sua lembrança de Fred, porque eu estou sendo egoísta em mudar meu visual apenas para não ver meu irmão morto no espelho.
- Essa é muito clara. – Ela continuou. – Tenho medo que depois de pegar um pouco de sol, volte a ficar ruivo. – Devolveu as duas caixas na prateleira.
- Então sobra essa. – Falei pegando a caixa da sua mão. – Castanho médio.
- Acho que vai servir. – Ela disse por fim, esperando minha reação. Fiz um formato de sorriso nos lábios e concordei com a cabeça.
Ela pegou mais alguns itens enquanto passávamos pelos corredores e seguimos para a fila do caixa.
- null! – O moço do caixa disse empolgado o suficiente para se engasgar com a própria saliva, ele devia ter a nossa idade e usava um jaleco branco, como se já não houvesse branco o suficiente naquela loja.
- Oi, Pete. – null disse não tão entusiasmada, mas ele não pareceu se abalar.
- Nunca mais te vi por aqui. Voltou ao internato? – Perguntou ele, enquanto separava os itens que ela havia colocado sobre o balcão.
- Não, na verdade estou aqui com um amigo. - Ela disse, segurando a manga da minha camisa. Ele me olhou de cima a baixo, analisando minhas feições cansadas antes de continuar:
- Amigo, é? Sua avó comentou que você terminou o namoro faz um mês. Ela esteve aqui ontem. Aquilo era ciúmes que eu via em Pete? null nunca havia mencionado algum Pete para mim antes, tenho certeza de que se ele fosse realmente importante, eu reconheceria o nome.
A inconveniência de Pete me deu nos nervos, mesmo que null tivesse realmente terminado o namoro ou não, o que importava para ele? O respeito passou voando pela janela em uma porra de Firebolt.
- Sim, George é um grande amigo meu, e está me ajudando com toda essa coisa chata de término. - null continuava com a mão agarrada na manga da minha camisa, como se aquela conversa fosse completamente inconveniente para ela também. É claro que era, tenho certeza de que até quem estava atrás de nós na fila também estava sentindo a situação esquisita em que Pete nos colocou.
- George, huh? Vejo que superou o término com facilidade. - Disse Pete, e eu estiquei a mão até ele, que apertou sem vontade alguma.
- É um prazer te conhecer, Pete. - Falei falsamente simpático. - Escuta só, de onde você vem é comum ficar se intrometendo em assuntos pessoais dos seus clientes?
A garota atrás de mim na fila segurou uma risada. O único som além desse era o apito que a máquina em sua frente fazia cada vez que ele colocava um produto sobre um feixe de luz vermelho. Pete desviou o olhar de nós sem graça, terminou de embalar os produtos em uma sacola de papel e esticou para que null pegasse, mas o fiz antes que ela apenas para irritá-lo.
Quando estávamos na calçada, ouvimos passos apressados e Pete veio até nós.
- Olha sou, null, me desculpa. Não quis ser indelicado com toda essa situação chata. Você está a fim de tomar um café comigo qualquer dia desses?
- Eu fico lisonjeada pelo convite Pete, mas vou ter que recusar. - null foi direta.
- Por quê? - Não havia nada no mundo que pudesse abalar a autoestima desse garoto, não era possível.
- Porque não tenho cabeça para isso agora. - Ela disse sem cerimônias.
- Ah, sim... Entendi. – Pete levantou o olhar para mim. – Já está namorando com ele, não é?
- Pete. Eu literalmente acabei de perder alguém importante na minha vida e não estou com cabeça para sair com ninguém. Eu só quero ir para o meu quarto e chorar a noite inteira, entende? – Ela disse, cada uma de suas palavras carregava um traço nítido de exaustão. – E George não é meu namorado, e se ele fosse, o que isso iria impactar na sua vida?
Minha amiga sabia se defender sozinha, tanto de praticantes de bullying, quanto de inimigos mortais e a prova disso foi ela ter sobrevivido a batalha de Hogwarts e ainda proteger vários alunos menores de idade, mas o principal era que null sabia escolher as palavras certas a qualquer momento, inclusive quando queria se livrar de um cara escroto.
Vi o semblante de Pete murchar diante de meus olhos, me olhou de cima a baixo novamente, ele era consideravelmente mais baixo do que eu, e se deu por vencido dizendo:
- Tudo bem, deixa para a próxima. – Não haveria próxima, tenho certeza disso.
Seguimos para o beco com cheiro de mofo novamente e aparatamos de volta à Toca.
- Então, tem algo que eu precise saber desse Pete? – Perguntei sentado em uma cadeira velha que trouxemos ao meu quarto, enquanto ela arrumava tudo para iniciar o processo de tingimento do meu cabelo.
null pegou um pente de madeira com dentes muito largos e passou por meus cabelos, fazendo-me fechar os olhos relaxado, o pente era seu, já havia visto ela pentear os cabelos molhados com ele.
- Fiquei com ele em um verão. – null admitiu. – Foram só uns beijinhos bobos, eu devia ter uns 15 anos na época.
- Aaaaah, está explicado! Você enfeitiçou o pobre garoto. – Dei uma risadinha marota e ela deu um tapinha no meu ombro.
- Não foi nada demais para mim, mas depois daquilo ele não pode me ver que age assim, como se tivesse algum tipo de propriedade sobre mim. Como se eu tivesse que me explicar cada vez que estou namorando alguém.
- Fred chegou a conhecê-lo? – Perguntei ainda de olhos fechados, com a cabeça apoiada no encosto da cadeira. Fred havia ido conhecer a avó de null, durante nosso primeiro ano da inauguração da loja, imaginei que talvez ele pudesse ter tido a péssima experiência de ter conhecido Pete. Na verdade, já conhecíamos a avó de null, nos encontramos algumas vezes na Estação King’s Cross e nas vezes que vínhamos buscá-la com papai para passar as férias conosco, porém nessa ocasião ele a “conheceu” como um namorado e não como amigo pentelho.
- Não. Ainda bem, provavelmente ele tiraria sarro de mim pelo ano seguinte inteiro. – Ela disse, dando uma risadinha. – G, se ajeite na cadeira, vou começar.
Abri os olhos, sentei ereto e ela passou um plástico em volta do meu pescoço, que parecia ser para proteger minha roupa de possíveis respingos. Abaixou-se levemente em minha frente.
- Tem certeza disso, George? Depois que eu começar, não tem volta.
- Tenho. – Respondi e logo continuei nosso assunto sobre Pete: - Bom, não dá para negar que ele gosta de você, afinal ele deve ter perguntado de ti para sua avó.
- Ah, ainda estamos falando dele? – Perguntou ela divertida.
- É claro, como vou poder zoar você mais tarde?
Ela iniciou o processo de colocar a tinta com uma bisnaga em meu cabelo e espalhar com um pincel, a tinta tinha um odor terrível de alguma poção que deu muito errado, mas como ela não fez observações, eu apenas confiei em seu processo.
Ficamos em silêncio a maioria do tempo, apenas o barulho do pincel molhando meu cabelo e da luva de plástico em sua mão participando da nossa trilha sonora.
- Se importa se eu ligar o rádio? – Ela perguntou em certo ponto do nosso silêncio e eu dei de ombros. Ela foi até o rádio que tínhamos no quarto para ouvir os anúncios dados em códigos durante a guerra silenciosa. Ela obviamente colocou em uma estação trouxa, sempre preferiu as músicas trouxas, que falavam sobre amor, desilusão, sexo e drogas, dizia que lembravam o seu pai, por mais que não tivesse memórias vívidas dele.
Uma música baixinha adentrou o ambiente e eu notei seu semblante mudar quando voltou até mim, ela começou a cantarolar baixinho junto com a mulher que cantava a música que eu não conhecia:
- And so I cry sometimes, when I'm lying in bed just to get it all out, what's in my head. And I, I am feeling, a little peculiar. (E eu choro algumas vezes, quando estou deitada na cama apenas para tirar tudo que está em minha cabeça. E eu, eu estou me sentindo um pouco peculiar).
Aquilo me pegou desprevenido, não esperava aquelas palavras saindo de uma música que estava ali com a sua única função de distrair nossas mentes enquanto ela colocava um produto fedorento em meus cabelos vermelhos. Me vi imediatamente caindo em um poço sem um fundo aparente: eu sabia que null estava triste com a morte de Fred, sabia que ela o amava e que eles estavam em um estágio feliz do relacionamento deles. Fred nunca mencionou um possível casamento (eu era um grande entusiasta desta ideia), até por que estávamos em um momento muito importante de nossas carreiras profissionais, e eu não falava apenas de mim ou dele, e sim de null também. Ela havia comentado conosco um interesse particular de Professora McGonagall em querer contratá-la como professora de poções quando Slughorn se aposentasse. Lembro que achamos aquilo incrível quando ela nos contou pela primeira vez, sabíamos da sua capacidade em reproduzir poções com maestria na escola, onde, mesmo com um professor altamente duvidoso como Snape, e principalmente o fato dela ser da Grifinória e ser nossa amiga e cúmplice, Snape odiava todas estas opções, ela sempre se saía bem nas aulas, e foi ela quem fez a nossa primeira leva de Amortencia para nossa loja até então portátil. null seria uma ótima professora. Eu tinha uma certeza absoluta sobre aquilo. Porém para que isso acontecesse, ela precisava desgarrar-se de mim, eu sabia que estávamos ambos em um momento em que precisávamos um do outro, sei que não teria conseguido fazer nada do que fiz hoje sem sua ajuda durante este mês inteiro... Mas vê-la aqui, desperdiçando o início dos seus 20 anos comigo trancada em um quarto me machucava mais do que eu queria admitir.
- And so I wake in the morning and I step outside and I take deep breath, and I get real high and I scream from the top of my lungs: What's going on? (E então eu acordo pela manhã e vou lá para fora e eu respiro fundo e eu fico muito chapada, e grito o mais alto possível: O que está acontecendo?). – Cantarolou ela, me retirando do transe. – Prontinho, Georgie.
Ela veio para a minha frente com um paninho molhado e retirou o excesso de tinta que havia escorrido em minha testa e em minha orelha debilitada, seus olhos correram pelo meu rosto e ela riu abertamente.
- O que foi?
- Vamos ter que pintar suas sobrancelhas, vai ficar muito esquisito se suas sobrancelhas continuarem ruivas. – Ela disse dando outra risada gostosa, acabei rindo junto, era a primeira vez que eu ria de verdade e sem motivo aparente, a música embalando nossa esquisitice enquanto ela passava o restinho de tinta em minhas sobrancelhas. null tinha o costume estranho de simplesmente olhar em nossa cara e dar risada, era como se fôssemos cômicos aos seus olhos a todo momento, não posso contar nos dedos quantas vezes ela fez isso comigo: me encarar por minutos consecutivos e no fim dar uma risada gostosa e frouxa. E foi apenas uma vez em que perguntei o motivo dela fazer isso e a resposta ser “Você e seu irmão têm uma áurea engraçada, é um timing cômico perfeito”, lembro que no dia respondi “E você tem certeza que não acha a nossa cara engraçada?”, e ela respondeu ainda com uma risadinha nos lábios “Não, a cara de vocês é bonita”.
Nunca vou esquecer esse diálogo, já que foi a primeira vez que uma garota disse que eu era bonito, eu tinha 14 anos e ainda não tinha experimentado a minha popularidade como um cara bonito, apenas sendo o “cara engraçado”, e aquilo foi importante em minha cabeça de pré-adolescente na época. E, tão importante quanto isso, foi saber que null confiava em mim o suficiente para falar aquilo e ter certeza absoluta de que eu não usaria contra ela em nenhum momento, eu nunca usei simplesmente porque gostei de saber que ela me achava bonito, e aquilo se concretizou quando ela e Fred iniciaram um relacionamento, afinal se ela me achava bonito ela tinha que automaticamente achá-lo também.
30 minutos depois, saí do banho e me olhei pela primeira vez no espelho.
Meu coração deu um baque descompassado e meus olhos encheram-se de lágrimas, não eram lágrimas de arrependimento, pois um cara completamente diferente me olhava pelo reflexo. Não era meu irmão gêmeo morto.
Suspirei aliviado notando que null havia sido incrível com sua habilidade em pintar cabelos no método trouxa e, novamente, estava certa quanto à cor dos meus olhos que antes tinham um tom verde no centro próximo das írises que iam aos poucos ramificando para um castanho muito claro, agora estavam completamente castanhos, o verde sendo extinguido pelo meu semblante mais escuro. Toquei meus cabelos, uma, duas, três vezes, ainda desacreditado que havia demorado tanto tempo para pedir aquilo a ela. Sentia-me aliviado, como se um peso absurdamente doloroso tivesse saído de meus ombros, um ponto de autoestima subiu dentro de mim e eu sabia que iria querer continuar com aquele cabelo por um bom tempo.
Uma página havia sido virada.
Esgueirei-me pelos corredores até meu quarto, não queria que ninguém me visse daquele jeito, não sem null junto para me dar o suporte que eu precisava.
- Então, o que achou? – Perguntei abrindo os braços em expectativa. Vi os seus olhos brilharem molhados novamente, e em seguida o seu sorriso abriu-se com uma alegria contagiante.
- Nossa, ficou ótimo! – Ela correu em minha direção e me abraçou com força, foi nesse momento que eu percebi que ela estava aliviada de não ter que ver Fred em mim também.
- Eu percebi esse tom de surpresa. Tinha alguma porcentagem de você que não acreditava que ficaria bom? – Retribuí seu abraço.
- Ah, só uns setenta e cinco por cento – Ela soltou uma de suas risadas divertidas. – Mas os vinte e cinco por cento restantes estavam bem confiantes!
- Você não vale nada. – Não consegui resistir e dei uma risada também.
Retribuí seu abraço sabendo que aquela garota em meus braços, com seu sorriso contagiante e seu cheiro particular de baunilha, era a melhor coisa que já havia acontecido em minha vida e na do meu irmão também.
- Vai ser uma situação delicada. Minha família tem cabelos ruivos há tantas gerações que não sei como vão reagir. – Eu disse incerto sobre descermos para o jantar.
- Eles vão entender. – null disse com calma, ela finalizava uma carta em nossa escrivaninha, sua coruja com o rosto em formato de coração a aguardava sob o batente da janela.
- Eu sei que vão entender, são a minha família, mas isso não me deixa menos nervoso.
- George, você é maior de idade, pode raspar os cabelos, fazer tatuagens ou pintar os cabelos sem levar um cascudo de sua mãe. Deixa de ser bobo.
- Eu sei, eu sei.
- E outra coisa, cabelos ruivos há gerações? – Ela repetiu. – Nenhum Weasley casou com alguém com outra cor de cabelo?
- Bom, sim, mas o gene ruivo deve ser bem forte. Não sei explicar, acho que é o caso da Gina com o Harry, ele tem cabelo escuro, mas se não me engano a sua mãe era ruiva... Se eles tiverem um filho, tem muita chance de vir alguns ruivinhos.
- Isso é bizarro. – Ela disse, em um tom divertido. – Será que se eu tivesse um filho com Fred, ou você com Angelina, o gene seria tão forte assim?
Ela se referia ao fato das duas serem negras.
Eu nunca nem havia pensado nesse assunto, nunca me importou a cor da pele ou de cabelo de nenhuma delas, Angelina era linda, alta, uma ótima atacante no quadribol e uma pessoa incrível, acho que foi por isso que me apaixonei por ela, nunca me preocupei com os genes ruivos dos Weasley, era até um absurdo pensar naquilo. E null, bom, ela era a null, eu não precisava explicar os motivos dela ser minha melhor amiga, ela simplesmente era, e não era a cor dos seus cabelos ou da sua pele que faziam aquilo acontecer. E por um momento aquilo me acendeu uma luz de alerta por dentro:
- null... – Chamei sua atenção e ela tirou os olhos de sua carta para me olhar. – Tem algum motivo para você estar preocupada com os genes dos Weasley’s?
O silêncio se instalou entre nós por um segundo que pareceu uma eternidade.
- null. Olha pra mim. – Pedi quando a vi desviar os olhos, seus olhos voltaram a me encarar brilhando marejados. Me aproximei dela, sentindo meu coração apertar e minha garganta embolar novamente. – Porra, null, você ia esconder isso de mim?
- Eu não tenho certeza nenhuma, não queria te preocupar com isso também. – Ela disse voltando toda a sua atenção para a pena em suas mãos. – Comprei um teste na farmácia, pensei em fazer de madrugada.
- Você só pode estar de brincadeira comigo! – Respondi tão exasperado que o nó em minha garganta pareceu apertar. – null, você não precisa passar por isso sozinha. Por Merlin, não depois de tudo que você fez por mim.
- Eu sei que não, eu só não queria que você se incomodasse com algo que não é certo.
- E desde quando algo que você faça é um incomodo para mim? Geralmente é ao contrário e eu nunca vi você reclamar!
Eu estava agachado em sua frente, retirei a pena de suas mãos antes que a tinta fizesse sujeira e apertei suas mãos do mesmo jeito que ela havia feito comigo tantas vezes.
- Eu estou aqui e não vou a lugar nenhum.
Ela sorriu, suas bochechas apertaram seus olhos e as lágrimas correram por elas.
- Eu estou aqui, igual um idiota, reclamando do que meus pais vão achar da merda do meu cabelo e você está tendo uma crise existencial por uma possível gravidez do meu falecido irmão! Se isso não é egoísmo, eu não sei o que é.
- Nós dois estamos fodidos, Georgie, um não anula o outro. – Ela disse fungando.
- Eu sei que não, mas não faça mais isso comigo. Estamos na mesma merda de barco. Você não precisa velejar sozinha. – Eu disse e ela me encarou durante alguns segundos e caiu na risada.
- Que bosta de metáfora! – Exclamou ela sem ar, ainda dando risadas altas.
- Você é uma idiota. – Respondi me juntando a ela nas risadas.
Durante o jantar, ninguém ousou falar uma palavra, mas eu sentia os olhares queimando sobre mim, posso jurar que até ouvi um soluço assustado de minha mãe quando ela me viu pela primeira vez, e os pratos só não caíram no chão porque Harry foi rápido o suficiente com sua varinha.
Todos jantaram incomodados, e eu até senti a mão de null acariciando minhas costas em um certo momento, enquanto eu terminava meu prato e ela já havia terminado o seu.
- Ficou bom, George. – Ouvi a voz de Gina dizer, tão incerta e trêmula que achei que ela nem iria conseguir dizer meu nome inteiro.
Eu a encarei por um segundo, com o garfo no meio do caminho até a boca.
- Obrigado. – Falei e enfiei a comida em minha boca. Senti null apertar minhas costelas, como quem dizia “fala mais alguma coisa”. Terminei de mastigar e engoli o bolo de comida com dificuldade. – Eu... Precisava fazer isso.
- Ficou lindo, meu amor. – Minha mãe disse, dando-me um sorriso que era difícil ela dar a nós. Normalmente eram caras zangadas, e com razão.
- Obrigado, mãe. – Era perceptível que aquela era a conversa mais longa que eu havia tido com todos eles depois do incidente, todos estavam orgulhosos. Não havia nenhum olhar de julgamento, apenas olhares caridosos de uma compaixão que eu achava um pouco irritante, mas não queria demonstrar isso. A mão de null continuava em minhas costas, me aquecendo mesmo que ela não percebesse.
- Estava me incomodando um pouco o fato de eu me olhar no espelho e... – Não precisei terminar a frase. Todo mundo automaticamente ficou inquieto e eu percebi que não tinha necessidade de falar aquilo. Então finalizei com: - Não se preocupe, Ron, você continua sendo o irmão mais feio.
As risadas quebraram o gelo, e Rony ficou com as orelhas vermelhas, mesmo que estivesse sorrindo.
- Estamos felizes por você, Georgie. – null finalizou aquele assunto piscando para mim e bagunçando meus cabelos. Todos concordaram com a cabeça.
Mais tarde naquela noite, enquanto eu e null esperávamos minutos infinitos pelo seu teste de gravidez mostrar a resposta definitiva, eu a abraçava pelos ombros sobre a minha cama enquanto ela encarava o teste com as pernas cruzadas.
- Foi por isso que o seu ex ficou me encarando estranho! – Exclamei do nada, enquanto minha cabeça voava pelo momento em que estávamos na loja comprando os utensílios necessários para pintar meus cabelos. – Você simplesmente jogou um teste de gravidez trouxa na cara dele!
- Sim. – Ela riu sem muita graça. – Ele não é meu ex. – Replicou irritada.
- É claro que é. – Tentei brincar, tentando de alguma maneira tirar todo aquele peso de seus ombros. Eu nem conseguia digerir de verdade o fato de que null podia estar realmente grávida de Fred, aquilo não entrava em minha cabeça, não agora que ele não estava aqui conosco, sem que eu pudesse tirar sarro do fato dele virar pai. Pai! Porra, aquele era o pior momento do mundo para tentar fazer piada. Me arrependi imediatamente de ter insistido naquela brincadeira sem graça sobre Pete, porém senti o cotovelo dela batendo em minhas costelas, e uma risada nasalar vindo logo em seguida.
- Eu nunca devia ter te contado sobre isso. – Ela suspirou divertida e percebi que minha piadinha infame havia tido o efeito que eu queria que tivesse.
- Não mesmo. – Falei ao mesmo tempo em que o despertador tocou em minha mão. Eu o segurava com tanta força que os nós do meu dedo haviam perdido a cor, apertei o botão entre os dois sinos e a garota ao meu lado suspirou audivelmente antes de virar o rosto para mim.
- Eu tô aqui. – Falei, apertando seus ombros em meu braço com força.
Ela virou o teste, de modo que o lado com o resultado fosse visto por ambos. Eu não fazia ideia de como se lia o resultado, então esperei por sua reação. Na verdade, eu não sabia se null queria aquela gravidez, como uma pequena lembrança permanente de meu irmão, ou se ela não queria aquilo por conta da sua idade, a falta de um pai ou de simplesmente não desejar uma gravidez. Eu não a conhecia como ela me conhecia, e aquilo me doía um pouco, eu não conseguia prever suas reações do mesmo jeito que ela conseguia prever a maioria das minhas.
- Deu negativo. – Ela disse sem emoção. Seu rosto virou-se para mim e não consegui ler sua expressão. – Deu negativo. – Repetiu e dessa vez eu senti a pontada de tristeza em sua voz.
null queria a gravidez.
Porra, aquilo me machucou demais.
Tirei o teste de suas mãos e joguei em algum canto, e puxei-a para meu colo. Dessa vez eu tinha que ser o elo forte da nossa amizade, ela contornou seus braços em meu pescoço e chorou.
Eu sentia seu peito tremer sobre o meu com a força de seus soluços, meus braços estavam em volta do seu tronco e minha mão estava pousada na parte de trás da sua cabeça. Eu tentava com todas as minhas forças não chorar com ela, e me concentrava em manter minha respiração calma para que ela se acalmasse junto. A sensação de impotência era tão grande que eu não conseguia pensar em mais nada a não ser: Ela está triste porque queria ter o filho de um pai morto apenas para conseguir se sentir conectada ao Fred de alguma maneira, ela agarrou-se com tanta força nesse fio invisível de esperança que quando o fio foi cortado, havia despencado em um abismo de tristeza que eu não fazia ideia de como tirá-la agora, pensei durante vários minutos, tentando encontrar as palavras certas para dizer naquele momento, para ela era tão fácil juntar um monte de palavras que resultavam em algo bom para mim, que quando eu tinha que fazer o mesmo, me sentia uma bola gigante de bosta.
- null. – Falei, e pigarreei. – Eu sei que não parece, mas... Essa foi a melhor opção.
Senti seu peito parar de tremer por um segundo e ela fungou.
- Você sempre vai estar conectada ao Fred. Sempre. Não importa quanto tempo passe. – Continuei, acariciei suas costas com minha mão livre.
- Eu... Só queria... Não sei, pensei que... – Ela não sabia como explicar aquilo, mas eu sabia exatamente o que ela sentia.
- Não precisa se explicar para mim. Eu sei.
null provavelmente estava pensando naquilo há pelo menos uma semana. Sua cabeça provavelmente havia dado voltas e mais voltas diante daquela situação, era óbvio que ela havia imaginado mil e um cenários e tinha se agarrado com mais força no cenário em que tinha um bebê dele. Sua decepção era aceitável e completamente compreensível, eu, em seu lugar, teria me agarrado na mesma opção, mesmo que aquilo dificultasse minha vida em maneiras inimagináveis.
E foi assim que terminamos aquele dia, agarrados um no outro, com tantos sentimentos misturados e tantas lágrimas derramadas que era fácil dizer que estávamos realmente quebrados.
Tantas coisas aconteceram naquele mesmo dia que o meu término com Angelina parecia, pelo menos, há uma semana de distância, e aparentava ser tão pequeno e insignificante enquanto eu abraçava aquela criatura chorosa em meu colo que nada no mundo me faria largá-la.
Fim do ponto de vista
Flashback – 05 de março de 1990 – Sala Comunal da Grifinória
- O que vocês dois estão mexendo aí com tanto segredo? – Me aproximei de Fred e George, que estavam em um canto realmente afastado, debatendo com um velho pergaminho em mãos. Mal terminei a pergunta e vi Fred retirando o pergaminho das mãos do irmão e escondendo sob as vestes.
- Infelizmente não é da sua conta, null. – Ele retrucou, grosseiro como sempre. Por sorte eu já sabia como eles eram e apenas dei de ombros virando os olhos para cima.
- Vê se cresce, Weasley. – Respondi sentando na frente deles, deixando bem claro que não ia me afastar por conta de uma grosseria do ruivo. Há esta altura, eles já deviam ter entendido que eu não largaria do pé deles.
George suspirou e olhou para o irmão levantando as sobrancelhas e os dois conversaram com os olhos por alguns segundos, cogitando se iriam me incluir no assunto ou não, enquanto eu os observava pensando o quão era estranho o fato deles se entenderem sem ao menos abrirem a boca.
- Ok. – Fred suspirou vencido. – Encontramos este pergaminho na sala do Filtch.
- Ainda não temos certeza do que é, mas definitivamente é algo interessante. Estava bem guardado e identificado como “Confiscado e altamente perigoso”. – George concluiu, e esticou a mão ao irmão para que lhe entregar o pergaminho.
Interceptei o pergaminho no meio do caminho entre as mãos dos dois.
- E vocês não sabem o que faz, é isso? – Perguntei analisando o papel surrado com as dobras finas de tanto ser aberto e fechado.
- É. – Os dois falaram juntos e explodi em risadas, por tamanha burrice dos dois.
- O que, em nome de Merlin, vocês estão fazendo com um pedaço de pergaminho sujo e surrado nas mãos se nem sabem o que faz? E ainda estavam de segredinhos para mim! – Eu ria alto, trazendo um pouco de atenção à nós e eles pediram para que eu fizesse menos barulho, virei os olhos novamente teimosa.
Retirei a varinha de corniso de minhas vestes e apontei para o pergaminho sussurrando:
- Revele-me seus segredos. – Me lembrava de ler algo na biblioteca sobre pergaminhos encantados, eu passava mais tempo na biblioteca do que gostaria de admitir, era apavorante ser uma nascida trouxa no meio de tantos bruxos e bruxas puro-sangues, e ir à biblioteca fazia parte do meu dever semanal, de minha meta mental, para me manter atualizada sobre assuntos bruxos que havia perdido durante meus onze anos de vida como uma nascida trouxa. Também para evitar de cair em qualquer pegadinha infame que os gêmeos ou Lee gostavam de pregar em mim, por ser tão ingênua e não conhecer o suficiente sobre o mundo deles.
O pergaminho em minha mão mostrou uma frase que li em voz baixa.
- O Sr. Aluado pede para que pessoas que não tenham habilidade para tamanho esplendor não tentem fuxicar onde não são chamadas.
- O quê?! – George exclamou e pulou para o meu lado, e continuei lendo:
- O Sr. Pontas gostaria de acrescentar que este pergaminho não deve ser lido por pessoas de boa índole.
Minha cabeça girou por um momento, tentando lembrar de tudo que já tinha lido sobre o assunto e lembrei de um livro bem específico chamado “Pequenos objetos e encantamentos”, levantei em um salto, assustando os gêmeos que me seguiram. Pus a varinha e o pergaminho entre as vestes e corri até a porta do retrato da Mulher-Gorda. Eu tinha certeza que li algo parecido com aquilo, lembrava até a sessão onde o livro se encontrava.
- Ei, aonde você está indo? – Um dos gêmeos perguntou, eu não soube distinguir qual, ainda não tinha convivência o suficiente com eles para diferenciá-los sem olhar, mas era outra meta que já tinha colocado em minha cabeça.
- Biblioteca, acho que li algo sobre isso semana passada enquanto estudava.
Já na biblioteca, recuperando o fôlego, cada um de nós procurava em um andar na seção de livros que indiquei. George encontrou o livro correto e folheei por alguns minutos.
- Aqui! – Falei mais alto do que devia e recebi um olhar de Madame Pince, e cada um dos gêmeos pôs a cabeça ao lado da minha, lendo o parágrafo que eu apontava. – Pergaminhos, penas e livros encantados: Comumente utilizado por adolescentes como forma de pregar peças, um pergaminho pode ser enfeitiçado para que apenas pessoas com as palavras secretas possam ler, as palavras podem ser das mais variadas e usualmente utiliza-se um juramento solene sendo que ao ser quebrado, o objeto enfeitiçado possa ser novamente apagado impossibilitando o bruxo de continuar a ler.
- Um juramento? – Fred perguntou confuso.
Continuei lendo concentrada, enquanto Fred e George murmuravam mais afastados coisas que só eles entendiam.
- Só temos que descobrir como mostrar o que ele esconde... – George murmurou.
- Depois talvez os próprios criadores consigam responder como apagar, talvez dê para perguntar... – Fred pensou alto.
Enquanto eles debatiam, tirei o pergaminho das vestes e olhei as respostas que os Srs. Aluado, Pontas, Rabicho e Almofadinhas haviam me dado quando pedi que revelassem seus segredos. Talvez cada resposta que eles dessem fosse um insulto e uma dica. Era divertido, quase como se eu estivesse tentando desvendar alguma brincadeira idiota dos gêmeos e Lee.
- Eu juro solenemente que não vou mostrar a ninguém. – Sussurrei ao pergaminho, tocando levemente a ponta da varinha no mesmo, que devolveu mais respostas de seus criadores, as ofensas eram divertidas a ponto de me fazer segurar a risada.
- Eu juro solenemente que não pretendo ajudar ninguém. – Disse novamente esperançosa, e isso chamou a atenção dos gêmeos que se aproximaram.
- Eu juro solenemente que tenho más intenções. – Tentei novamente, lembrando que Sr. Pontas disse que o pergaminho não devia ser lido por pessoas de boa índole, as respostas continuavam me divertindo, era quase como um livrinho de piadas que minha avó tinha guardado na gaveta do criado-mudo.
- Eu juro solenemente que não vou fazer nada de bom. – Senti minha varinha praticamente dar o toque sozinha no pergaminho que começou a se colorir sozinho, formando desenhos de corredores e paredes lentamente.
Lembrei imediatamente de Sr. Olivaras dizendo que uma varinha de corniso é excêntrica e travessa, adora brincadeiras e gosta de parceiros que procurem diversão. Aquilo me abraçou por inteiro, pois eu sabia que se aquela varinha com núcleo de pelo de unicórnio havia me escolhido, estava aí o motivo, ela queria diversão e eu sabia que podia proporcionar aquilo.
- Por Merlin, null! Você conseguiu! – Fred disse abrindo um sorriso sincero, os olhos arregalados enquanto o pergaminho mostrava a frase:
“Os Srs. Aluado, Rabicho, Almofadinha e Pontas,
fornecedores de recursos para feiticeiros malfeitores, têm a honra de apresentar:
MAPA DO MAROTO”
Nós comemoramos tanto, mas tanto, que nós três recebemos detenção e menos cinco pontos (cada) para a Grifinória pela bagunça que fizemos na biblioteca.
Voltamos para a Sala Comunal analisando o mapa, olhando cada dobra e abrindo cada espacinho para entender como ele funcionava. Em menos de cinco minutos, descobrimos como o apagava, que era com a frase “Malfeito, feito”, e depois desse dia, percebi que nada naquela amizade podia separar o que havíamos construído, exploramos cada saída não oficial do castelo, descobrimos o que cada professor fazia após o horário das aulas, e nem mesmo o Diretor Dumbledore podia se escapar de tamanha façanha, já que sabíamos que ele ficava quase o dia inteiro andando de um lado para o outro em seu escritório.
Não era exagero dizer que eu, Fred e George nos tornamos inigualáveis após nos apoderarmos do Mapa do Maroto e durante todas as vezes em que saímos juntos para explorar o castelo, mais certeza eu tinha de que aquela amizade duraria mais do que apenas na escola.
Fim do flashback
Continua...
Nota da autora: Trauma emocional atualizado com sucesso. Essa fic está me deixando doida, me pego pensando nela mais do que gostaria e as vezes me pergunto o motivo de ter demorado tanto para escrevê-la. Espero do fundo do meu coração que vocês estejam gostando tanto quanto eu estou gostando de escrever! E se tiverem um tempinho, deixem um comentário, adoraria saber o que estão achando desse surto nostálgico.